20 outubro 2008

Cinema


foto:Acervo Vera cruz

Sei que não é uma brincadeira exclusivamente minha, conheço um monte de gente que brinca também, mas com certeza é uma das minhas favoritas.
De verdade nem encaro como brincadeira, me permito a pensar que é mesmo real, e me divirto.
Imagino que há uma câmera filmando a história de cada um de nós.
No meu filme, chego a fazer direção de fotografia, figurino, me preocupo com continuismo, contra-regra, trilha sonora...
Admiro embasbacada cada cena, cada enquadramento...
O cenário eu só aprecio, só posso interferir no da casa da mocinha, hehehehehe...
Mas por estas coisas da vida vim morar num cenário de beleza incontestável.
Mudou tudo, o enredo, a personalidade da personagem central e a velocidade das coisas...
Tudo é contemplação, virou quase um documentário.
Meu olhar agora anda grudado numa lente macro.
Quero ver quase por dentro de tão perto, tudo, gente, bicho, pedra, flor.


foto:Symon Days

Virei o personagem de um documentário sobre as belezas de um lugar abençoado pela natureza e com aspectos antropológicos pra lá de intrigantes.
Na semana passada teve o 1º Festival de Cinema Internacional daqui. Iniciativa bacana, filmes bem selecionados, tenda climatizada montada na praça principal e tudo gratuito.
Minha mente com ranço babilônico pensou: Vixe, vai lotar !
Uma voz tranquila e experiente me disse: Vai nada !
Tinha razão. Assisti todas as sessões que desejei, sem fila, sem tumulto e melhor, sem gastar um tostão.
Mas o melhor de tudo foi ver “por dentro” o cinema da cidade, que está fechado há quarenta anos. Aqui as reformas custam sair pois por serem patrimônios históricos, existe um cuidadoso trabalho de restauração.
Que lindo é o cinema daqui, suas paredes estão sem a massa deixando expostos os tijolos originais, o que dá ao local um aconchego de casa de fazenda, chorei quando vi.
O chão apenas cimentado, os bancos colocados apenas para o evento poderiam ficar assim como estavam para sempre. Confortável e informal, ameiiiii!!!


foto:Symon Days

As caras que rondavam pelo evento, como sempre, era na sua grande maioria de turistas.
Isto me assusta:
os moradores não tem o hábito de desfrutar de toda oferta de coisas que há por aqui.
No sábado do festival onde estava a galera da faixa etária dos 15 aos 25 anos?
No baile funk, é claro.
30 mil habitantes, uma sala de 300 lugares, filme brasileiro bom e gratuito e onde estão os jovens, no baile funk.
Valha-me Deus ! Educai-nos ó pai !
Mas enquanto esperávamos o milagre, eu e mais 299, dentre eles o Príncipe Legítimo (que também tem sua casinha por aqui...) desfrutamos da oportunidade que nos foi dada.
E paralelamente eu estrelando meu documentário pessoal:
• sentei atrás do Príncipe Gato, ouvi seus comentários a um amigo ao sair da sessão:

” Nossa nunca vi tanta mulher dentro de uma sala de cinema !!!”

Huahuahuahua, não nega a genética nem a História!!!

• comi um lanche, peguei minha bike, e lá fui em direção à roça, passei em frente ao baile funk que bombava e aumentei o número de questionamentos dentro da minha cabecinha:

Será que ao menos a Lua Cheia eles enxergam?


foto:Symon Days

Veículo Pernamotor


Foto:Symon Days

Nos meus tempos de Babilônia, uma das coisas que mais me estressavam era o tal sistema de transportes.
Pra trabalhar enfrentava diariamente aquele trem que me deixava maluca, na balada ônibus só até a meia noite, metrô cada vez mais inviável, ou seja, você é obrigado a se matar de trabalhar para comprar uma “família”.
Sim, isso mesmo, porque a partir do ato da compra você adquire uma boca a mais pra sustentar: IPVA, seguro, estacionamento,combustível... E trânsito, congestionamento, doidos violentos, afff vejo uma gastrite descontrolada correndo em minha direção.
Pois é, nada fácil a vida dos Babilônicos !!!
Já aqui no Balneário Brasil Colônia tudo é diferente...
Existem duas condições: dentro e fora da cidade.
Podemos enquadrar como dentro: perímetro urbano, zona rural do outro lado da rodovia e seus arredores. E o fora: localidades as margens da rodovia, e obviamente as cidades próximas.
Para a grande maioria dos habitantes do “dentro”, o grande meio de transporte é o democrático “veículo pernamotor”, e isto é uma maravilha !
Aqui os bebês já saem da maternidade sobre duas rodas e com uma brisa marinha deliciosa soprando em seus rostinhos. Gente de todo tipo criança,velho,gordo, magro, ricos e pobres, uniforme ou traje de banho, todo mundo pedalando...
Ainda me emociono ao olhar o balé silencioso. Ninguém buzina, ninguém corre, só aquela cadência deslizante de quem sabe pra onde vai, e não tem pressa!
Dia de chuva é lindo, pra todo lado guarda chuvas sobre duas rodas, acho engraçado como uma imagem tão inocente me provoque tamanha excitação!


Foto:Symon Days


A cidade possui duas ciclovias, uma no centro beira-rio, boa para passeio, e outra que dá acesso a zona rural , ou seja meu caminho para casa, 3km de pura alegria de viver.


Foto:Symon Days

Fazenda de gado, mata, passarinhos, árvores de flor. Ando apaixonada por cada centímetro deste chão. Faz parte da “Estrada Real”, por onde se fazia o transporte do ouro das Minas Gerais até o mar. Tudo bem conservadinho, faxina quinzenal, embora os amantes da sujeira continuem a deixar seus rastros.


Foto:Symon Days

Eu ouço sempre a trilha sonora de Luiz Gonzaga a cantar “Estrada de Canindé”:

“Mas o pobre vê nas estradas o orvalho beijando a flor
Vê de perto o galo Campina que quando canta muda de cor
vai molhando o pé nos riachos de água fresca, nosso senhor
vai olhando coisa a grané, coisa qui pra modi vê
o cristão tem que andar a pé...”



(ou de bike...)


Foto:Symon Days

Atualmente meu objetivo é conduzir sem o uso das mãos, como alguns malabaristas que vejo passar e daqui algum tempo terei um “ciclocargueiro”, igual ao de uma senhorinha que sempre cruzo na ciclovia.
Um triciclo com carreta adaptada, um luxo !!!
Tive que adapatar minha companheira para esta nova realidade: cestinha e bagageiro são essenciais por aqui pois o fator social também é grande, afinal caronas são comuns e é preciso cuidar do bem-estar e segurança do passageiro.
Só há um probleminha: o lado de fora.
Não me arrisco pedalar na rodovia, existem muitos relatos de acidentes.
Minha praia favorita fica a uns 25 km, sempre uso as vans para chegar lá, mas para outros locais o transporte é escasso, então quando eu conseguir um dinheirinho compro um fusquinha ou uma moto e me torno uma poluidora eventual, porque paixão mesmo eu tenho é na minha “magrela”, que como eu é um escândalo!!!


Foto:Symon Days

01 outubro 2008

Aventuras no BBC – Balneário Brasil Colônia



As muito feministas que me perdoem, mas essa historinha de direitos iguais só veio pra cortar o meu barato.
Eu nasci mesmo é pra ser “do lar”.
Sem patrão, é lógico!
Organizar minhas coisinhas, lavar, cozinhar, limpar, botar até a alma no sol pra ficar com cheirinho de delícia.
Tenho levado vida de princesa: acordo quando desperto, preparo meu desjejum, assisto religiosamente meus amados capítulos de Dragon Ball-Z, trabalho um bocado, almoço, invento coisas, dou meus rolês de bike, banho, jantar, artesanato ou namoro, dormir só quando os olhos desistem ...
Agora tem as aulas de inglês e as noites no CineClube.
Nos finais de semana (sempre chuvosos) muito love e explorações dos mais belos recônditos da paisagem local.
Praia que é bom, até agora nadinha, só para um piquenique semanas atrás...



Adaptada?
95%.
Os últimos cinquinho por cento se dá por conta de uns pequenos e fúteis detalhezinhos:
• Sou invisível ( Afff como é difícil estabelecer relações!)
• Sou fêmea (quando estou acompanhada, as pessoas não me dirigem nem olhar, quem dera um olá)
• Tecnologia (nem telefone, nem internet)
• Prestação de serviços (Esqueça: no Brasil Colônia ninguém sabe o que isso significa, acho que por isso inventaram a Babilônia)

No mais é só isso:


isso:


foto:Marcelo Carmo

e isso:

Casa nova, Vida nova... (ou Minha Vida com os Insetos)

Um longo e gelado inverno...
Encaixota, guarda, empacota, etiqueta, identifica.



Tudo num caminhão, 350 km depois, identifica, desempacota, desencaixota, monta, limpa, guarda.
Resumindo, um bocado de tempo sem grandes emoções...
Os barulhos novos, os novos cheiros e aquele intervalo que o corpo precisa até assentar na toca nova.
Claro que comparações são inevitáveis, afinal saí do miolo do coração da Babilônia e fui me entocar na zona rural do Balneário Brasil Colônia.
O ar cheira mar, mesmo aqui no meio da mata.
Uma das primeiras grandes surpresas foi poder ouvir o silêncio em toda sua profundidade.
O volume da tv abandonou a casa 20 e agora repousa feliz na cota 8.
Huahuahuahuahuahua, Babilônicos uní-vos, tratem urgente de canonizar algum santo protetor auricular.
Falar do cricricri dos grilos seria o óbvio ululante, mas o que impressiona mesmo é o duelo noturno incrível entre enormes tribos de galos e cães.
Quem foi que disse que os galos cantam de madrugada?
Aqui cantam o dia inteirinho, festeiros estes galos beira-mar.
Mas o grande encontro marcante foi com o incrível Planeta Inseto.
Já teve de tudo: pernilongo do tamanho de uma chave, besouros de todas as castas,percevejos, baratas, formigas, moscas de todas as cores, pulgas, aranhas e carrapatos.
Dizendo assim pode parecer assustador, mas para uma bióloga com mania de fotografia é um vício.
Deixo o serviço doméstico e fico lá dando close-ups nos bichinhos pop-stars.



Existem momentos em que tenho plena certeza de que morri e fui pro céu.
Como eu sei ? Agora eu tenho QUINTAL: com grama de verdade, plantas de verdade, flores de verdade, um gato de verdade, passarinhos e borboletas legítimos e esvoaçantes.
É ou não é o céu?



Dureza agora é essa deslumbrada conseguir manter o foco, lembrar que trabalhar é preciso e tratar urgente de arranjar um ganha pão, mesmo porque o céu é bom mas tem que haver algum degrau acima senão as almas se acomodam...