07 maio 2002

O meu maior problema é achar que a galinha do vizinho é sempre mais saborosa do que a minha. Não é que eu não dê valor ao que é meu, mas sempre tive a impressão que fiz as escolhas erradas. Mesmo ganhando a tão sonhada bicicleta de Natal, a minha era uma Caloi dobrável e a da minha amiguinha era uma Cecizinha. A dela me parecia trezentas vezes melhor que a minha. Os uniformes escolares eram iguais, mas eu andava de Conga e as minhas amigas de Bamba ( que eram tão baratos quanto, mas nos pezinhos delas pareciam sapatinhos de cristal). Eu sempre achei a minha casa mais feia, minha família mais problemática, e por aí afora... Quando adolescente tive uma amiga, que claro era loira do olho azul, e delicada como uma orquídea, e eu a amo até hoje, mas nos afastamos pois eu não sobrevivi a uma vida de comparações. Não preciso nem contar das desilusões amorosas, achando que meu bem amado sempre seria mais feliz se fosse com alguém tão maravilhoso quanto ele. E assim foi, perdi meus homens jurando que eles mereciam algo bem melhor do que eu. Engana-se, se você acha que eu não me amo. AMO. Sou forte, saudável, bem-humorada, uma mulher e tanto, mas me transformo numa lesma presa na própria concha, caso alguém diga a palavra DISPUTA perto dos meus sensíveis ouvidos.Não tenho segurança o suficiente para competir em nada.Não é trauma, é sina. Muitas das vezes em que me violentei e aceitei o desafio, saí vitoriosa, mas o prêmio nunca valeu a tortura. Hoje me questiono sobre minha opção profissional, afinal eu poderia ter sido qualquer coisa.Sou pau pra toda obra, não sou apenas pé de boi, sou o boi inteiro, e mesmo assim isso não vale muito. Assisto a gente incompetente se enchendo de dinheiro, enquanto eu, e muitos dos meus amigos, sobrevivemos a um período perturbador, onde seu valor moral e profissional não vale NADA. Neste momento tudo continua como quando eu tinha tres anos de idade, a opção do vizinho ainda parece muito melhor que a minha.

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