07 abril 2008

Outras Palavras...



Ah, como a vida vai ficando mais colorida à medida que o tempo passa !!!
Hoje vejo com euforia aquilo que já foi considerado tragédia: ser membro de uma família numerosa (muito numerosa) e pobre.
Sou apenas mais uma netinha dos oitenta e poucos netos de minha deliciosa avó.
Dá até preguiça contar pra saber qual o meu número na lista.
Individualidade, privacidade e propriedade são palavras inexistentes no dialeto de minha maluca e baiana família.
Sim, fui criada no meio do samba do criolo doido: muito beijo, muito abraço, muito riso, muita troça, muito choro, muita autoridade, muito apego, muito tudo...
E muita criatividade, pois se não houvesse criatividade não haveria baiano...
Outro dia, eu e meu primo Néu conversávamos sobre "particularidades" de nossa gente, e chegamos a conclusão que uma coisa que nos diferencia dos demais é o dialeto. Existem algumas palavras que nós só ouvimos ali e quando as usamos em outros lugares geralmente somos motivos de riso ou de total incompreensão como se estivéssemos a falar outro idioma.
Não que as palavras não existam, mas talvez tenham se perdido num tempo que lá em casa não passa nunca.
Para o Néu a nossa palavra símbolo é "Briquitar" que significa desde distrair-se, empenhar-se até cismar ou fazer pequenas coisas.
MInha vó diz muito : Ihhh, briquitei o dia todinho pra ver se conseguia fazer aquilo, mas que nada, não consegui.
Já para mim, a nossa cara tá numa expressão que ouço desde a barriga de minha mãe: "Módiontá".
Se fechar os olhos sou capaz de ouvir meu avô dizer:
- Cadê minha fiinha que não vem módiontá o padinho??? Cadê???
Irresistível !!!
Lá ia eu ver o "Padinho" ganhar colinho e ser "dengada".
E ele dengava a todas sem distinção, da mais bebê até as moçonas...
Sem dúvida alguma, o melhor avô do mundo era o meu.
A melhor combinação de autoritarismo e carinho que eu já vi em toda minha vida.
Imagino eu que "módiontá" significa "de modo a estar" ou "para onde está" ou algo deste tipo.
Quando fui buscar o dicionário descobri que aqueles meus avós quase analfabetos eram suuuuper bem letrados...Briquitar era um verbo muito usado em 1913, e tem uma palavrinha que minha avó adora, que data nada mais nada menos que do século XIV, a palavra é "reimoso".
Bastava você ficar doente que lá vinha aquela conversa :
"Não pode comer peixe, abacaxi, manga, ovo, carne de porco, é muito reimoso.
Faz aí um pirãozinho ou uma sopinha de carne com batata!"
Reimoso significa: que prejudica a saúde ou capaz de causar pruridos.
Que relação tem o peixe com o porco, ou tudo isso com o ovo , a manga e o abacaxi eu não sei, mas também não era nem besta de desobedecer minha "Madinha", além do mais a chance de ganhar um pirãozinho era uma alegria pra quem tava dodóizinho...
Hummmmm, pirão de vó, hummmmmm !!!!
É poesia por si só, dispensa palavras.

Um comentário:

Ana Carmo disse...

eu nunca mais serei a mesma depois da pita, do podrinho e da frevioca!