As horas mortas

 
Não é para ser um lamento, só um lembrete para aqueles momentos em que insisto em esquecer as coisas ruins e pintar o mundo de colorido poliana...
Trago marcada em minha pele a frase "Não me arrependo de nada", mas me arrependo...
Deveria poder apertar a tecla retorno e fazer de novo...
Compulsão ou intuição, a quem  devo obedecer ?
Por que insistir em tudo aquilo que está na cara que vai dar errado?
De onde vem esta mania de acreditar que o mundo quer ser transformado e apenas espera que eu o faça?
Ahhhhhh quantos quereres !!!
Em 2002 enfrentei a depressão, nadei com força e para cima e jurei que nunca mais voltaria lá no buracão escuro e sem fim. Aprendi a respirar.
Talvez o que tenha possibilitado o ressuscitar tenha sido o trabalho.
E é justamente por isto que espero agora...
Jamais imaginei que um dia passaria por isto: neste momento cozinho o jantar no álcool pois não tenho dinheiro pra comprar o gás e no final desta semana não terei o dinheiro pra pagar o aluguel.
Devo futuramente me lembrar que cheguei a este ponto, devo também me lembrar como vim parar nesta situação.
Tenho 42 anos, trabalho desde os 15,  só vivi um curto período de desemprego em 2001.
Hoje estou aqui, com minha falência decretada, tentando vender os poucos objetos que me restaram.
Vendendo o almoço para comprar o jantar...
As mãos que me foram estendidas, me mandam energias positivas, que são super válidas mas não enchem a geladeira.
Não cheguei ainda no capítulo FOME, mesmo porque engoli tanta coisa ultimamente, que vai demorar muito tempo para ter a barriga vazia.
Engoli meu orgulho, minha macheza, minha independência, minha língua...
Cuspí para cima e me afoguei.
Sou uma fonte de cultura que jorra para quem não tem sede.
Me sinto sendo cuspida da Matrix...
É óbvio que qualquer hora destas vou descobrir um jeito de surfar esta onda, e vou voltar para um lugar onde haja sol. Mas quando lá estiver, vou me lembrar que nenhum homem que amei veio me acudir neste momento turbulento. Que nenhum amigo me pagou um almoço ou uma cerveja...
Que só para variar, a única pessoa neste planeta que não dorme pra velar meu sono é minha mãe.
E por fim, que não adianta chorar, porque se a cada lágrima derramada eu ganhasse 10 centavos, estaria distribuindo dinheiro e não sofrendo pela ausência dele.
Um dia pensei que eu mudaria o mundo, hoje me assombro com o tanto que ele tem mudado a mim.
A realidade substituiu a minha pele.
Estou menos doce.